O presidente salvadorenho Nayib Bukele em encontro com embaixadores credenciados em seu país no Palácio Nacional de San Salvador em 3 de maio de 2021. Imagem divulgada pela Presidência de El Salvador.


Destituição de magistrados; blindagem de funcionários que participam de operações de compra de suprimentos para controlar a pandemia; impostos sobre jornais e a possibilidade de restabelecimento do voto no exterior. Com o apoio do Parlamento, o presidente Nayib Bukele diz que está "limpando a casa" em El Salvador.

Seguem algumas chaves para entender as manobras desta semana do presidente, que fortalece seu poder em meio às críticas internacionais.

- Controle do parlamento -

Assim que foi instaurada, em 1º de maio, a Assembleia Legislativa, onde os aliados de Bukele têm 61 dos 84 assentos, destituiu os magistrados da Sala Constitucional do Supremo Tribunal Federal, indicados por seus antecessores. A justificativa foi que os juízes adotaram decisões "arbitrárias" que bloquearam várias medidas presidenciais para enfrentar a pandemia.

O procurador-geral também foi afastado do cargo por seus laços com um partido da oposição. Em ambos os casos, os nomes dos substitutos já estavam prontos.

“O que está acontecendo em El Salvador é basicamente um produto das eleições de 28 de fevereiro”, quando o partido de Bukele, o Novas Ideias (NI), varreu as eleições parlamentares e deixou os tradicionais partidos Arena (à direita) e o ex-guerrilha de esquerda Farabundo Martí Para a Libertação Nacional (FMLN) tornaram-se minoria, após décadas de supremacia.

“O povo não nos mandou negociar: todos vão embora”, declarou o presidente. “Esta Assembleia está cumprindo o que prometeu, está cumprindo, por isso não se veem grandes manifestações (de rejeição) na rua (...) o povo está feliz”, continuou Bukele em encontro com o corpo diplomático ao criticar a condenação internacional de seu governo.

Em defesa da ação, o Bukele garantiu que foi o Arena quem colocou no cargo o procurador-geral demitido, enquanto a FMLN indicou o procurador de Direitos Humanos, por acordo.

Diante disso, o presidente defendeu o direito do governo de nomear pessoas de sua confiança para esses cargos, embora não tenha especificado se destituirá o procurador.

- Poder "absoluto" -

O presidente, um milenial de 39 anos que assumiu o cargo em 2019, conseguiu capitalizou sobre o descontentamento dos cidadãos com os partidos tradicionais. Suas decisões são amplamente festejadas nas redes sociais, enquanto nas ruas as manifestações contra seu governo são minoritárias.

“Estamos caminhando para um Estado autoritário, para um Estado onde os direitos humanos e as liberdades fundamentais não são respeitados, e essa concentração de poder, infelizmente, só nos leva a uma ditadura”, advertiu o parlamentar da oposição René Portillo.

Segundo o vice-reitor da Universidade Centro-Americana (UCA), Omar Serrano, as decisões da Assembleia marcam "sinais inequívocos dos rumos" que o governo tem tomado e que apontam "na direção da concentração do poder absoluto nas mãos de uma pessoa ou de um grupo ao redor do presidente".

- Blindagem em compras e impostos a jornais -

Na quarta-feira, o Parlamento aprovou uma lei do governo que concede "imunidade a ações judiciais e processos judiciais ou administrativos" para aqueles que participam da aquisição de produtos ou serviços para enfrentar a pandemia de covid-19.

“Eles a aprovaram como uma lei de ordem pública, de forma que é retroativa e os processos por má gestão da pandemia em hospitais públicos continuam impunes”, afirmou Portillo.

No entanto, o ministro da Saúde, Francisco Alabí, garantiu que as críticas à lei se devem a "uma interpretação equivocada da mídia".

No mesmo dia, a Assembleia também eliminou benefícios fiscais para jornais, em sua maioria críticos ao presidente.

“Não era justo que o arroz com feijão pagassem impostos e os jornais não. Eles desfrutavam de benefícios para desinformar a população”, afirmou o ministro de Obras Públicas, Romeo Rodríguez.

- Votação no exterior -

A Nova Câmara Constitucional pediu à Assembleia que legislasse para permitir que a diáspora salvadorenha - mais de 2,5 milhões de pessoas- pudesse votar nas eleições, algo que atualmente só é permitido nas eleições presidenciais.

A maioria dos salvadorenhos que moram fora do país fugiu da crise econômica nas décadas anteriores. Suas remessas representam 22% do PIB do país.

“Para os governantes anteriores a diáspora nunca foi uma prioridade. Eles sempre a esqueceram e só se lembravam em tempos de campanha”, criticou a deputada da situação Ana Figueroa.

- Perigo de sanções -

A vice-presidente americana, Kamala Harris, disse que os Estados Unidos "devem responder" à destituição de magistrados em El Salvador.

O país centro-americano tem uma economia dolarizada que sofreu uma contração de 7,9% em 2020, com uma dívida externa que gira em torno de 90% do PIB. A pobreza atinge 35% da população.

“Não tenho dúvidas de que haverá sanções”, afirmou o deputado Portillo.

El Salvador negocia para receber um financiamento de US$ 1,3 bilhão do FMI para fazer frente às consequências da pandemia. O governo disse que as negociações ainda está em andamento e que dialogou com outros organismos multilaterais.






Yahoo/cmm/mav/mls/am